O do é o caminho, a senda reta que outros percorreram antes e nos transmitiram sua experiência em forma de um ensinamento.
…entendemos que é necessário afastar a mente de possíveis más interpretações; em primeiro lugar, a prática do do, o caminho, implica obviamente uma disciplina. Mas esta palavra pode despertar certas associações que não correspondem à realidade da prática. Não é a disciplina da rigidez própria de alguns costumes militares, nem reside no fato de cumprir algumas normas que a pessoa não compreende, nem se trata de uma exigência disciplinar externa. Incumbe a disciplina no sentido mais simples e essencial do termo, porque a palavra disciplina deriva claramente de discípulo , marcando a atitude que lhes é própria. A disciplina é a atitude daquele que quer aprender e o Aikido é um eterno aprender a aprender. E para aprender, assim como para desenvolver qualquer atividade proveitosa, é necessária certa ordem, do mesmo modo que se faz necessário manter um escritório ordenado para que a atividade possa fluir agilmente. No Aikido levamos à prática uma disciplina interna e isso significa uma disciplina da pessoa com ela mesma. Não se trata de exigir disciplina do outro como ocorre em algumas educações tergiversadas, nas quais o superior exige disciplina do inferior, mas ele mesmo não a tem. Trata-se de poder chegar a ser- por assim dizer- amo de si mesmo, de autodisciplinar-se mediante o desenvolvimento da prática marcial.
… O do também se fundamenta no compromisso.
O verdadeiro significado do compromisso converteu-se infelizmente em algo bastante estranho para a mentalidade reinante atual. Não obstante, sentimos que toda pessoa que conserva sua dignidade sabe, em uma parte de si mesma, que o compromisso é essencial. Na perspectiva da cultura japonesa, o compromisso está ligado ao hara , ao centro físico e espiritual da pessoa, que se situa no abdômen. Aquele que atua a partir do hara se compromete com suas entranhas em toda ação que empreende. Mas se tomamos a ação mais exemplar do compromisso, a de dar nossa palavra, observamos que a palavra verdadeiramente sentida é dita a partir do hara , não movida por um capricho do momento. Por isso, no Japão se diz que antes de dar a palavra, deve-se pensar três vezes com o hara, isto é; o compromisso não pode surgir como um fruto de um pensamento isolado, de um sentimento passageiro.
… Insistimos nesse ponto porque entendemos que é vital compreender o fundamento de uma ética prática da dignidade humana: em cada fato em que dou minha palavra, comprometo o profundo do meu ser- o meu hara- e o gravo a fogo em mim mesmo. Cada ato põe em jogo a minha integridade… se a palavra está dada, envolve a integridade da pessoa. Por isso não se deve acostumar a mente a dar uma palavra que depois não será cumprida. Assim, deve-se diferenciar a mera conveniência daquilo que significa o compromisso autêntico… Quando se empenha a palavra, deve-se agir em conseqüência. Contudo, ocorre muito habitualmente que, depois, surge alguma oportunidade de algum trabalho ou de maior prazer e deixa-se o compromisso de lado. Assim se faz o conveniente, mas se esquece o mais importante: a palavra empenhada. Com a repetição, essa modalidade produz um costume. A mente aprende a dar palavras que não cumpre e o hara se debilita, a integridade se deteriora.
Por esta razão, a conveniência individualista é contrária ao movimento do do , do caminho que conduz ao crescimento… Quem percorre o caminho do Aikido, de toda verdadeira arte marcial ou caminho espiritual, tem que pôr seu ser inteiro. Quando isto é feito, compreende-se o que é compromisso e age-se responsavelmente em conseqüência.
… Ocorre muitas vezes que uma pessoa começa a praticar e me diz emocionada: “O Aikido mudou minha vida, estou muito agradecido”, mas com o tempo, frente à primeira dificuldade, deixa de praticar. Onde ficou aquele agradecimento?! O que se fez daquele desejo inicial que parecia invencível?! Quando isso ocorre, percebe-se a falta de compromisso.
É preciso que se entenda que esse comprometer-se no do é uma obrigação que se toma para si mesmo. Quando realmente é assim, o compromisso leva à superação das próprias limitações, à evolução.
…Se não se agradece e não se mostra com ações concretas o compromisso, não se demonstra respeito por aqueles que lhe beneficiaram com o ensinamento: corta-se o teu caminho e desonra-te a ti mesmo.
A observância da disciplina, do agradecimento e do compromisso te fortalece, mantém-te no do, assim te tornas parte dele e encontras teu próprio caminho.